6. A Hipótese de Saturno
“Homenagem a ti, Touro de Amentet, o deus Toth rei da eternidade, está comigo. Sou o Grande Deus perto do barco divino, combati por ti. Sou um dos deuses, aqueles chefes divinos, que fazem Osíris sair vitorioso dos seus inimigos no dia da pesagem das palavras.” (Do Livro Egípcio dos Mortos).
No início, após o primeiro impulso da Criação, após a manifestação do Verbo em Luz, o nosso sistema planetário não existia. A Via Láctea era um conjunto de nebulosas indistintas constituídas pela matéria primordial da formação dos mundos (coágulos brancos). De acordo com a antiga ciência oculta que nos chegou através da Índia, a lei das transformações ou do renascimento dos mundos sob formas semelhantes mas sempre novas, após longos sonos cósmicos (noites de Brahma), aplica-se tanto às estrelas como aos planetas, tanto aos deuses como aos homens.
O nosso sistema planetário não passava de uma dessas nebulosas, à qual a tradição antiga chama Saturno. De facto, verificações recentes confirmam que este planeta ainda está num período de contracção, o seu núcleo é ainda pequeno em relação à enorme massa gasosa que o compõe mais os satélites que o circundam, e liberta três vezes mais calor do que aquele que recebe do Sol, quer dizer, está ainda, aparentemente, numa situação por que outrora passaram todos os astros do nosso sistema solar, incluindo a Terra, o que também quer dizer que o actual Saturno é o remanescente de toda aquela nebulosa de onde se criou o nosso sistema planetário.
Esta nebulosa englobava toda a massa que veio a formar mais tarde, por fases, o Sol e os planetas tal e qual os conhecemos hoje. A nebulosa saturnina, essa massa indistinta, não tinha luz mas tinha calor originado pelo conjunto de átomos que a constituía. Não havia nenhum brilho no seu interior, nenhum clarão de luz se soltava da sua imensidão que, supomos, abrangeria a distância que hoje vai do Sol ao Saturno actuais.
No entanto, essa massa não estava em repouso, não jazia adormecida, algo se agitava no seu seio, pois o seu interior era atravessado por arrepios de frio e emanações de calor. O Génesis fala-nos destas convulsões que se verificavam no interior da nebulosa quando diz: “A Terra estava sem forma e vazia; as trevas estavam sobre a superfície do abismo e o Espírito de Deus movia-se sobre as águas.”
Esta é uma forma alegórica de contar a mesma história. Os Elohim, que na tradição hebraica e no singular é o Criador, mas que seriam os seres criados por Deus antes do tempo no dizer de Martinés de Pasquallys, representavam o Espírito de Deus e pertenciam à mais alta hierarquia dos Poderes.
Cabe aqui fazer um parêntese para explicar o que era esta hierarquia de Poderes. Esta hierarquia existe tanto na teologia cristã, como na tradição hebraica, caldeia ou na tradição hindu, só que nesta última tomam nomes diferentes. Podemos chamar-lhes anjos, inteligências ou energias. Na obra “A Cabala” de Papus encontram-se mapas com a descrição destes Poderes, a sua ordenação hierárquica, a sua correspondência com os nomes de Deus, com as letras do alfabeto hebraico e com as Sefiras da Árvore Sefirótica. Na tradição hindu, estes Elohim chamam-se “Dhyân-Chohans”, e na tradição caldeia, estes seres chamam-se “Asuras” ou “Devas”.
Na tradição hebraica foi Elohim que pronunciou o “Fiat Lux” dando origem a todo o processo da Criação. Isto só se pode compreender porque para esta tradição não é permitido pronunciar o nome de Deus, e então atribui-lhe o nome Elohim no singular, numa alegoria ao Deus supremo. De outro modo não se poderia compreender que os hebreus atribuam o mesmo nome Elohim a outros seres da sua hierarquia, como por exemplo, “Schaddai-Elohim”, “Elohim-Helion”, “Gibor-Elohim” e “Tseobaoth-Elohim”. Da mesma forma, o nome Jeovah aparece associado a vários dos seres que constituem a sua árvore hierárquica. Que nos perdoem os cabalistas, mas é assim que compreendemos a escala mostrada no “Mundo Divino” de R. P. Esprit Sabbathier.
Na tradição cristã, os Elohim têm o nome de Tronos e, segundo ela, eles sacrificaram-se, dando o seu corpo em holocausto para permitirem o nascimento dos Arqueus ou Espíritos do Começo. Este corpo dado assim em sacrifício, não era mais do que calor vital, emanação de amor.
Os Arqueus, também eles uma classe de Elohim, eram seres criados por Deus antes do tempo e eram provenientes de uma evolução cósmica anterior, permanecendo passivos no seio da Divindade. Tomaram novo alento com o sacrifício dos Tronos, recebendo destes a força e o calor vital que os tornava «deuses criadores» numa nova evolução cósmica.
Temos aqui uma questão interessante, a cedência do lugar e energia dos Elohim (Tronos) aos Arqueus, para que estes pudessem agir no processo criativo. Isto quer dizer que a hierarquia desses seres não resulta somente da sua importância ou poder, mas também das suas propriedades e virtudes e existem em função da necessidade. Neste caso, a necessidade do trabalho da Criação obrigou os primeiros a sacrificarem-se em favor dos últimos, para que estes pudessem prosseguir no processo criativo. Por outro lado, estes seres, os Arqueus, diz-se que vinham de uma evolução cósmica anterior e renasceram para uma nova evolução cósmica. Esta evolução cósmica é o que anteriormente referimos como “o dia de Brahma” que, de acordo com a tradição hindu, abrange um período superior a quatro biliões de anos, ao qual precede e se segue um período de duração semelhante chamado “a noite de Brahma”, em que tudo se recolhe sobre si mesmo.
Assim, o Universo renasce ao fim de um longo período de absoluto repouso, e com ele renascem também muitos seres que participaram em Universos anteriores. Se isto acontece com o Universo, como não acreditar que a evolução do homem se faz através de inúmeros renascimentos, ou encarnações? O sistema é o mesmo, o homem reflecte o Universo em si, ele é o microcosmo que repete, como um eco, o que se passa no macrocosmo. Como dizia Thoth, ou Hermes Trismegistus, o que está em baixo é como o que está em cima.
Segundo Édouard Schuré, no seu livro “A Evolução Divina da Esfinge ao Cristo”, era pela acção destes seres, os Arqueus, que se verificavam as emanações de calor no interior da nebulosa saturnina a qual, do mesmo modo que um ser vivo, tinha a sua inspiração e expiração. A inspiração produzia o frio e a expiração o calor. Durante a inspiração os Arqueus penetravam no seu seio; durante a expiração aproximavam-se dos Tronos e bebiam a sua essência. Assim, cada vez mais eles iam tomando consciência de si mesmos, e cada vez mais se desprendiam da massa saturnina. Explicando melhor, a evolução destes seres, os Arqueus, era feita através da sua actividade no interior da nebulosa saturnina e evoluíam junto com ela, depurando-se e despojando-se dos seus elementos inferiores, deixando atrás de si uma fumaça gasosa.
Então, estes seres não eram perfeitos? Não tinham sido eles emanados directamente de Deus e agiam segundo a consciência que Deus lhes imprimira? Não, nenhum ser é perfeito, mesmo que pertença à mais alta hierarquia, pois a perfeição não existe, ela é, ela está em Deus e somente aí. A evolução não é algo individualizado no homem ou na natureza terrestre, não é algo que diga respeito apenas a um mundo específico ou conjunto de mundos. A evolução engloba todo o Universo, todas as coisas e todos os seres. Portanto, a partir do primeiro instante da Criação, tudo está em evolução permanente.
Ao mesmo tempo que os Arqueus exerciam a sua tarefa criadora, outros Elohim de segunda hierarquia actuavam na nebulosa por dentro, colocando-a em rotação. Por isso, ao seu redor, a formação de um anel de fumaça gasosa que, rompendo-se mais tarde, devia formar o primeiro planeta, o Saturno actual com o seu anel e os seus oito satélites.
Por esta descrição podemos afirmar que a Criação não é obra de Deus? De modo nenhum pois, estes seres que assim operavam eram eles próprios criados por Deus e agiam de acordo com os seus desígnios. Podemos dizer que a construção de uma catedral é obra de Deus? Claro que sim, embora tenha sido erigida por seres humanos. É assim com todas as coisas, pois nada existe que não seja a expressão da vontade do Criador.
Neste momento, os cépticos, aqueles que não acreditam em nada senão naquilo que os seus sentidos físicos podem experimentar e verificar, talvez sorriam e digam para si mesmos que isto não passa de um exercício de imaginação prodigiosa, e que a formação dos planetas, das estrelas, não foi mais do que obra do acaso associando átomos ao longo de milhões e milhões de anos, de modo a surgirem em matéria concentrada na forma de planetas, estrelas e todo o mundo material que conhecemos. Respeitamos esta sua posição pois, ela faz parte do seu plano evolutivo. Mas nós sabemos que o acaso não existe, que nada acontece por acaso, que há sempre uma causa e um efeito que presidem a qualquer acontecimento. Se isto é assim, se existe sempre uma razão por detrás de qualquer ocorrência, não faz nenhum sentido, para nós, pensarmos que a formação dos sistemas planetários, como o nosso, tenha sido obra do acaso.
A própria teoria de Darwin e dos seus seguidores até aos dias de hoje sobre a evolução das espécies, não desmente isto, até o comprova, pois ela diz que as espécies vão evoluindo e se adaptando em função das condições climáticas e do meio ambiente em que vivem. Ou seja, a causa está nas condições a que têm de se adaptar, o efeito nessa adaptação. Não diz que a evolução é feita ao acaso. No entanto, os defensores desta teoria continuam a defrontar-se com um enigma para o qual ainda não conseguiram obter uma resposta satisfatória: as espécies parecem manter-se no mesmo estado, sem qualquer mutação, durante longos períodos, e de repente, de forma abrupta, sofrem uma mudança. Isto leva a crer que a evolução das espécies não é feita de forma gradual, esta condição parece não existir. O que está verificado são mutações abruptas, repentinas, no sentido em que se realizam num curto período de tempo comparado com aquele em que as espécies não sofrem nenhuma alteração.
Parece que, de repente, as espécies, sejam elas animais ou vegetais, tomam consciência de que precisam mudar. Então começam um processo rápido de adaptação às novas condições. Uma das coisas que nunca entendemos muito bem e que constitui, de certo modo, um mistério, é o caso das pestes que grassaram na Europa durante a Idade Média, quando não havia antibióticos ou penicilina, nem nenhum tipo de medicamento que as combatesse eficazmente. Estas pestes apareciam ás vezes com características extremamente virulentas, devastavam populações inteiras e depois, de repente, desapareciam. Hoje acredita-se que os vírus provocadores dessas pestes ganhavam uma certa forma de consciência de que, se continuassem o processo indefinidamente, se destruíam a si próprios por esgotarem os corpos hospedeiros onde proliferavam, e assim, em determinada altura paravam e remetiam-se a uma forma de letargia até ao dia de reaparecerem no mesmo ou em outro local.
Definitivamente, e considerando apenas a extrema complexidade dos seres mais simples, a Criação não pode ser obra do acaso, assim como o homem também não o é, mas isto veremos mais adiante. Mas para os que tenham dificuldade em aceitar a existência destes seres criados por Deus antes do tempo, os quais tenham sido, realmente, os construtores do Universo ao serviço, bem entendido, do seu Grande Arquitecto, talvez lhes seja mais fácil aceitá-los como formas de energia, controladas e operando pela vontade de Deus na grandiosa obra da Criação. Seja como formas de energia ou sob o aspecto de seres celestiais, com asas ou sem elas, o que é certo é que eles fazem parte do imaginário do homem desde os tempos mais remotos.
Com toda a sua actividade, o grande sonho dos Arqueus era o de criarem um mundo, mas não o podiam fazer na sombria nebulosa de Saturno, que englobava, como já dissemos, toda a matéria de que é formado hoje o nosso sistema planetário. O Sol ainda não existia, não havia luz, e eles precisavam de luz, de luz física, porque sem ela não podiam criar. Eles lembravam-se, ou pressentiam, essa luz criadora de outra evolução cósmica onde tinham também desempenhado o papel para que se sentiam vocacionados – criar! Na sua alma divina, eles não tinham deixado o seio de Deus, eles operavam dentro dele, idealizavam a majestade do Arcanjo, a beleza do Anjo, idealizavam o homem em toda a sua alegria e tristeza. Mas para que esse sonho de criação se concretizasse, eles precisavam de luz, precisavam de um Sol no coração de Saturno.
Neste sonho não concretizado por falta de luz, os Arqueus entorpeceram, porque eles não podiam criar a luz, isto não estava dentro das suas capacidades, embora fossem Elohim de grande poder. Voltaram então os Tronos, que se envolveram como um tufão na noite saturnina. Outros Poderes os ajudaram neste trabalho de condensação de toda aquela massa gasosa que borbulhava entre ondas de frio e calor. Quanto tempo durou esta tarefa? Não conseguimos sequer imaginar, talvez alguns largos milhões de anos. Quando os Arqueus despertaram do seu longo e profundo letargo, acharam-se a flutuar sobre uma esfera de fogo e sob uma coroa de luz etérea, ao redor de um núcleo de fumaça sombria.
O primeiro Sol tinha nascido. O astro inteiro, com o seu centro obscuro e a sua fotosfera, ocupava o espaço que vai do Sol actual ao planeta Júpiter. Os Arqueus eram os seus jovens mestres, os novos deuses que deslizavam sobre um oceano de chamas. Em júbilo, saudaram a luz envolvente. Através dos fluidos véus das ondas luminosas, eles perceberam, pela primeira vez, os Tronos, semelhantes a círculos alados que subiam afastando-se na direcção de um astro longínquo. Este ia diminuindo e se perdendo no infinito, onde os Tronos desapareceram com ele. Então os Arqueus gritaram: “A noite saturnina acabou! Eis-nos vestidos de fogo e reis da luz. Agora podemos criar segundo o nosso desejo, pois o nosso desejo é o pensamento de Deus.”
Para a nossa mente habituada ao mundo material que nos rodeia, há aqui coisas muito estranhas: seres que deslizam sobre um oceano de chamas; seres que se afastam no espaço em direcção a um astro longínquo, que pode ser um planeta ou uma estrela. Esse oceano de chamas devia ter temperaturas elevadíssimas e portanto, não podiam permitir nenhumas condições de vida. Devemos notar que estamos a falar de seres que não têm corpo material, que são seres etéreos ou, se quisermos, que vivem numa dimensão totalmente diferente da nossa. O que entendemos como condições para a vida se manifestar, são aquelas que nós concebemos no nosso plano material. Embora conheçamos a história da salamandra (fénix) que renasce das cinzas, que sobrevive ao fogo, não concebemos a ideia de que, por exemplo, num mar de fogo e chamas que deve ser o Sol, ou num planeta onde as temperaturas extremas sejam muitas vezes superiores às da Terra, ou ainda na ausência de oxigénio e na presença de gases tóxicos, de que a vida possa existir. Naturalmente que não existe, nos moldes e nos padrões da nossa dimensão. Por isso, as várias sondas que têm sido lançadas para o espaço em procura de sinais de vida, não encontraram nada nem encontrarão nunca, enquanto essas sondas forem concebidas por uma tecnologia que está conforme essa ideia, a de que a vida só pode existir pelos nossos padrões.
Por esta tecnologia que desenvolvemos, nós não conseguimos ver os átomos, conseguimos apenas percebê-los. Nós não conseguimos ver nem perceber as partículas mais pequenas que o átomo, conseguimos apenas suspeitar da sua presença, porque em campos experimentais vemos os seus efeitos e o rasto que deixam na sua passagem, por vezes a velocidades superiores à da luz. Nós não sabemos, nem sequer suspeitamos, do que possa haver ainda para lá dessas partículas. Deste modo, podem verificar-se padrões de vida que não encaixam nas nossas concepções e não os conseguimos ver porque estão em campos vibratórios muito diferentes daquelas a que conseguimos até hoje ter acesso. A vida pode ter formas de manifestação que não cabem dentro da nossa imaginação.
Por outro lado, os seres que não são da Terra, mesmo esses seres angélicos que chamamos de Elohim, podem não residir simplesmente no espaço, pois isto seria fazer do nosso planeta o único local habitado de todo o Universo. Eles podem habitar alguns do infindável número de astros que compõem a nossa galáxia, só para falar desta, como as estrelas, os planetas e alguns desses astros estranhos com uma tremenda capacidade de emissão energética chamados quasares.
Para tentarmos compreender a Bíblia e outros textos antigos de uma forma diferente daquela que a sua leitura literal nos conta, em que Deus (humanizado) agiu directamente, temos de abrir a nossa mente e tentar alcançar, nem que seja em sonho, as prodigiosas possibilidades da Criação em se manifestar, como resultado da vontade primeva, do Verbo.
Dizem que em versões mais antigas da Bíblia, a palavra Deus como Ser Criador, aparece no plural: “No princípio, os Deuses criaram o céu e a terra”. Estes Deuses seriam os Elohim, esses seres de fogo, espíritos criadores. No entanto, mesmo nessa altura, já acontecia o drama que tem envolvido a Criação em todos os tempos – a existência de seres sombrios. Os Arqueus perceberam que ao redor da luz etérea que os envolvia, vogavam espíritos elementares assombrando o Sol que nascia. O astro mostrava-se luminoso, mas era rodeado por uma auréola negra – era a primeira demonstração de que a Criação não é possível sem perda, que a luz só existe porque se opõe à sombra, que só temos consciência do bem pelo seu oposto, o mal. É a esta situação que se refere a parte do Génesis quando diz: “E Deus separou a Luz das trevas”.
Que seres elementares e sombrios seriam estes? De onde provinham? Sabemos que seres desta natureza podem ser criados por pensamentos, tornando-se formas-pensamento e agindo independentes do seu criador. Já vimos atrás os perigos que pode acarretar o mau uso da palavra, mas a palavra, antes de ser formulada, é pensamento. Alguém disse um dia que pensar mal ou desejar mal a outra pessoa, é o mesmo que fazer mal a essa pessoa. Através do pensamento nós somos criadores, podemos fazer as coisas acontecer. Os seres elementares assim criados, essas formas-pensamento, podem ser de natureza amorosa como podem ser sombrios e carregados de ódio, conforme o pensamento que os originou. O que acontecia naquela altura e que os Arqueus vislumbraram, é o que acontece hoje ao redor da Terra, esta encontra-se rodeada de seres tenebrosos originados pelo homem, por todo o mal que o homem foi capaz de criar até hoje. Estes seres exercem uma influência poderosa sobre a humanidade, os continentes, as nações, e por isso vemos a cada dia acontecerem as coisas mais inimagináveis.
Os que rodeavam o primeiro Sol não podiam ter sido criados pelos Elohim, nem os Arqueus nem os Tronos os poderiam ter criado, pois eram seres divinos e, por esta condição incapazes de o fazer. Poderiam ser oriundos de uma evolução cósmica anterior mas, o mais provável, era serem originários de algum outro ponto da Via Láctea onde haveria já mundos criados num estágio muito mais avançado do que a Terra, pois esta nem sequer ainda existia.
Helena Blavatsky, na sua “Doutrina Secreta” afirma que os seres elementares das escalas inferiores não podem ascender a escalas superiores senão numa próxima evolução cósmica. Isto pode ser uma explicação para a sua existência à volta do nosso primeiro Sol. Mas a Criação, ainda que instantânea no momento do “Fiat Lux”, é uma obra progressiva, aliás como parece demonstrado acima pelo trabalho dos Arqueus e dos Tronos, e assim, no Universo da altura, já deviam existir outros sistemas planetários com os seus mundos já habitados por seres no seu caminho de evolução e portanto, com capacidade de emitirem pensamentos sombrios. O homem já devia existir em algum lugar do Universo. Será que isto era assim? Talvez, pois parece uma hipótese aceitável.
A esfera do primeiro Sol ia até ao Júpiter actual. Mais do que qualquer dos planetas que sairiam do seu interior, este astro estava vivo. Era constituído por um núcleo tenebroso de fumaça e por uma vasta fotosfera, não de metais em fusão como a do Sol actual, mas de uma matéria mais subtil, de fogo etéreo, límpido e transparente. Um espectador que estivesse colocado em Sírius e observasse o Sol de então, teria visto periodicamente a estrela brilhar e empalidecer, reacender-se e dilatar-se. Os astrónomos têm observado inúmeros fenómenos semelhantes no firmamento. O Sol primitivo respirava, inspirava e expirava regularmente. Enquanto que a inspiração parecia que lhe fazia perder alento, a expiração era uma maravilhosa irradiação de luz que se projectava para o infinito. Esta situação provinha da actividade dos deuses, dos Elohim que reinavam no astro.
Nesta altura, a missão dos Arqueus estava cumprida. Eles eram os espíritos do começo e, como tal, tinham dado início ao nascimento do primeiro Sol do nosso sistema planetário. Chegara a hora deles partirem para outras paragens para poderem gerar outros sois. Mas não partiram abandonando atrás de si tudo quanto tinham iniciado, a obra estava apenas começada e havia que a continuar no contínuo processo da evolução cósmica. Esta tarefa competiria a outros seres, sonhados e concebidos há muito pelos Arqueus, mas apenas, nessa altura, como formas-pensamento. Entre os Elohim, os Arqueus são dos mais poderosos mágicos pois, pela sua força de vontade podem dar vida e personalidade às formas-pensamento. Assim o fizeram, deram forma aos seres que lhes sucederiam na obra que haviam encetado, revestiram-nos de um corpo luminoso, astral, e de uma sensibilidade resplandecente. Então, sob o impulso dos Arqueus, os Arcanjos elevaram-se e tornaram-se os senhores do primeiro Sol.
Havendo uma hierarquia de seres, é natural que cada um desses seres tenha uma função específica para a qual foi criado. É assim que vemos os Tronos substituírem-se aos Arqueus e estes aos Tronos, e depois darem lugar aos Arcanjos. Neste plano, como em qualquer dos planos da Criação, cada ser tem a sua própria tarefa a cumprir. O novo Sol estava criado, havia que o habitar com seres que pudessem fazer com que esse Sol se continuasse a desenvolver.
À medida que se desenvolvia a vida espiritual dos Arcanjos, estes perceberam que na linha do Zodíaco se ia concentrando, num círculo prodigioso, um exército de espíritos sublimes, de formas diversas e majestosas. Eram os Querubins, que vinham concentrar-se em círculo ao redor do mundo solar para a incubação e fecundação dos Arcanjos. Os Querubins, junto com os Serafins, pertencem à mais alta hierarquia de Elohim. Eles são os habitantes do espaço espiritual, os Elohim da harmonia e da força. Vinham de todos os lados, das profundezas da galáxia, organizados em doze grupos. Os Querubins, junto com os Serafins, que são os espíritos do amor, estão mais próximo dos mistérios de Deus do que qualquer outro ser. Este acontecimento, esta reunião de Querubins em doze grupos ao redor do mundo solar, era conhecido dos magos da Caldeia e é a origem dos doze signos do Zodíaco, designação que foi conservada até aos dias de hoje.
Os antigos identificaram cada uma das constelações do Zodíaco com uma categoria de Querubins, e os seus quatro pontos cardeais eram representados pelos caldeus, pelos egípcios e pelos hebreus sob a forma de animais sagrados. Estes animais são o touro, o leão, a águia e o anjo ou o homem. São os quatro animais sagrados representados na Arca da Aliança de Moisés; são os quatro evangelistas, Mateus, Marcos, Lucas e João; são os quatro animais sagrados do Apocalipse de S. João. A Esfinge egípcia do vale de Gizé resume-os a todos numa única forma, simbolizando a evolução divina e terrestre. A águia foi mais tarde substituída pelo escorpião, não sabemos porquê, uma vez que a águia simboliza a morte e a ressurreição, e o escorpião apenas a morte.
As convulsões deste Sol primevo continuaram, agora sob o impulso da vontade dos Arcanjos, que por sua vez conceberam os Anjos. Dois novos planetas surgiram deste Sol – Júpiter e Marte. Mas a formação da Terra foi precedida de um acontecimento crucial que vem descrito em todas as tradições, nas mais diversas formas, mas cujo significado é o mesmo. Na tradição oculta chamou-se “O Combate do Céu”; para os gregos é o mito de Prometeu, ao qual se liga “O Combate dos Titãs e dos Deuses”; na tradição judaico-cristã foi chamado “A Queda de Lúcifer”.
A Terra só foi formada depois desta “Guerra dos Céus”, que terminou com a queda dos Anjos que se teriam revoltado contra Deus. Por muito que este episódio possa constituir uma alegoria, e não o podemos entender de outra forma, senão teríamos que ver Deus como um comandante supremo de um exército contra quem se teriam revoltado algumas das hostes desse exército, uma coisa do género “A Revolta na Bounty”, corresponde no entanto a algo de muito transcendente que aconteceu entre as hostes celestiais com consequências no processo de criação do Homem, pois esta revolta teve como causa exclusiva a criação do ser humano.
Parece evidente que esta revolta não poderia ser contra Deus, porque Deus não é um ser contra quem, alguém ou algum ser se possa revoltar, mesmo que esse ser pertença a uma classe elevada de Elohim, como os Arcanjos. E não é possível porque tudo está contido no seu seio, nada é exterior a Deus. Assim, entendemos que tenha sido mais o resultado de uma tomada de consciência por parte das hostes que desobedeceram ao plano idealizado, ou seja, ao plano que estava impresso nas suas consciências.
Lúcifer era um Arcanjo, o seu nome significa “Portador da Luz”, e era o Génio do conhecimento e do livre arbítrio. Todos os seres criados até então eram andróginos, sem sexo, uniam em si em perfeita harmonia as duas polaridades, a masculina e a feminina. Lúcifer concluíra que, para criar o homem como ser independente, rebelde e senhor dos seus desejos, era necessário separar os sexos, e moldou, na Luz Astral, a forma deslumbrante da futura mulher, a Eva ideal. Milhões de Anjos e Arcanjos ficaram extasiados com a imagem e, entusiasmados com a ideia, colocaram-se ao lado de Lúcifer. Foi quando toda a restante hierarquia recebeu ordem para o deter, ou seja, foi quando essa restante hierarquia agiu de acordo com o propósito para que fora criada.
Como todos sabemos, e como não poderia ser de outra forma, o combate que se seguiu (se é que chegou a haver algum combate...) terminou com a derrota de Lúcifer e dos seus pares, e a consequente queda num plano inferior, num planeta que ainda não era a Terra actual, mas a Terra primitiva semelhante à Lua.
A Bíblia não nos esclarece acerca deste acontecimento, antes ainda confunde um pouco as coisas pois, mostra-nos no Génesis duas criações sucessivas do homem: primeiro, Deus criou o homem e fê-lo homem e mulher, portanto um ser hermafrodita ou andrógino; depois criou a mulher a partir de uma costela de Adão, aqui a separação dos sexos. Mas estas duas criações não foram feitas pelo mesmo Deus, porque a primeira é referida como tendo sido feita por Deus, a segunda por Javé Deus. De qualquer maneira, entendemos que este acontecimento esteve sempre previsto, desde o primeiro instante, e corresponde a uma evolução natural na corrente da evolução cósmica. Estava, desde o princípio, inserido no plano divino. Se a vida, tal como a conhecemos na Terra, é o objectivo de toda a Criação, portanto da vontade divina, ela não poderia ser concebida na ausência da dualidade representada pelos sexos, pois tudo está feito em função dessas polaridades distintas e opostas. A Cabala fala-nos disso nas duas colunas exteriores da Árvore Sefirótica.
Então a “Guerra dos Céus” não será mais do que uma alegoria a algo que está impresso, desde o princípio, nessa Tela imensa da Duração que é o pensamento de Deus, e que Lúcifer, o Arcanjo caído (ou sacrificado), não é outro senão o Adão primeiro, o Adam Kadmon, que desceu ao mundo da matéria para aí ser o progenitor ancestral do Homem e este, através do seu corpo animal poder percorrer o caminho ascendente que o elevará a uma posição superior em toda a hierarquia dos seres. Mas para que isto pudesse ser feito, o homem precisava de dispor da sua vontade e do livre arbítrio, com os quais pudesse moldar a sua individualidade ao ser obrigado a uma escolha permanente, num mundo potencialmente criado para o bem e para o mal, tudo dependendo da sua vontade.
Édouard Schuré diz a este respeito o seguinte:
“Primeiro despertar do Desejo, do Conhecimento e da Liberdade, a tocha de Lúcifer não se acenderá com todo o seu brilho novamente senão no sol do Amor e da vida divina, em Cristo.
(......) Da elevação do Homem ao estado angélico, devia nascer no fim dos tempos planetários um novo Deus, a individualidade livre e criadora. Mas, antes, era preciso haver uma descida, em sombria espiral, no doloroso laboratório da animalidade! E quem poderia decidir qual sofrerá mais, o Homem, mais humilhado, mais atormentado à medida que toma consciência de si mesmo, ou o Anjo invisível que sofre e luta com ele?.”
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