segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Em Busca de um Propósito

Crónicas Avulsas
por: Manuel Pina



EM BUSCA DE UM PROPÓSITO

Um filósofo zen do século XX, Bhagwan Shree Rajneesh, mais conhecido no mundo ocidental como Osho, ainda que este não seja um nome, mas um título equivalente a “mestre” dentro da filosofia zen, dizia que a vida não tem propósito, que a vida é alegria, contentamento, diversão, riso – sem qualquer propósito. Que a vida é a própria meta de cada um, que não há mais nenhuma meta.
Entendido no sentido literal, significa que para ele, Osho, as pessoas deviam portar-se como crianças, deviam sentir-se com a inocência das crianças, ou seja, sem qualquer sentido de responsabilidade que advém do facto de entendermos a vida com um propósito. Porque sem um propósito, e enquanto seres humanos, a vida deixaria de ter qualquer sentido. Sem um propósito não teríamos civilização, viveríamos ainda como simples animais, como era, aparentemente, a situação da Eva (ou das Evas) e do Adão (ou dos Adãos) descrita no Génesis da Bíblia, tendo assumido a liberdade e a condução do seu destino após comerem do fruto proibido. Na verdade, Adão e Eva, quando no Paraíso, deviam ser mais uma espécie de “flores de estufa”, ou os melhores espécimes de um jardim zoológico para distracção dos “deuses”, do que seres inteligentes e responsáveis.
Na Natureza e no Universo parece que tudo conspira para desacreditar a teoria das crianças inocentes, parece que existe sempre um propósito em todo o movimento permanente que faz com que tudo seja impermanente. O ouro já foi chumbo num passado remoto; o diamante já foi um pedaço de árvore; muitos isótopos radioactivos se vão transformando, perdendo a sua instabilidade e adquirindo cada vez mais a estabilidade de uma matéria qualquer.
A natureza humana precisa de um propósito para sobreviver, sem o qual deixaria de ser humana. Da natureza humana fazem parte as emoções, os sentimentos, os sonhos, a inteligência, a força de vontade, muitas virtudes, mas também muitos defeitos, e o propósito, se não houver mais nenhum, é o de equilibrar na vida essas duas forças antagónicas, essa dualidade que muitos chamam de luz e sombra. Ao contrário de algumas ideias acerca da transformação da sombra em luz, ou de superação da sombra, o que temos de fazer é aprender a lidar com a nossa sombra, trazê-la para o consciente e compreendê-la, para a podermos dominar, já que não a podemos eliminar. A sombra é necessária para o nosso equilíbrio psíquico.
A necessidade de um propósito constitui também a essência das religiões, pois elas oferecem sempre um caminho, um objectivo a alcançar, justificando assim as duras penas a que estamos sujeitos na vida. Ganhar o céu, ou pelo menos o purgatório, é o grande propósito do cristianismo e islamismo, já que ninguém quer ganhar o inferno. As religiões orientais propõem o renascimento ou reencarnação sendo o propósito a evolução através das inúmeras vidas. Para a tradição esotérica o propósito será o retorno à origem através de várias encarnações, um retorno ao nosso estado primordial.
Podemos não saber qual o propósito da vida, o que não quer dizer que, pelo facto de não o sabermos, possamos concluir que a vida é sem propósito. Por intuição, e não por inteligência, ainda que esta faça também parte daquela, sabemos que esse propósito existe. No coração de alguns de nós, talvez dos mais sensíveis ou sensitivos, como agora se usa dizer, bate de quando em vez uma espécie de saudade, uma ânsia de voltar a um estado que não sabemos explicar mas que representa a casa, o “Nosso Lar” como diz uma obra de Francisco Xavier, um lugar a que sabemos pertencer, sem contudo sabermos explicar esse sentimento. Talvez seja por não pertencermos a esta Terra, por estarmos aqui de passagem, de visita ou, para resgatar os nossos pecados acontecidos em outros mundos. De facto, como já vi escrito algures, o ser humano é o único animal que não se encontra adaptado aos vários climas da Terra: enrola-se em peles e agasalhos nos climas frios e despe-se quase totalmente nos climas quentes; procura aquecer-se no inverno e refrescar-se no verão. Será essa “Volta a Casa”, como tão bem está demonstrado na parábola do “Filho Pródigo” do Novo Testamento o propósito da nossa vida, ou das inúmeras vidas por que temos de passar?