sábado, 8 de agosto de 2009

O Cosmos, o Homem e a Evolução

3 – O Verbo

“... a última Vibração da Sétima Eternidade palpita através do Infinito. A Mãe entumece e se expande de dentro para fora, como o Botão de Lótus.” (Da Estância III do Livro de Dzyan – Cosmogénese – “A Doutrina Secreta” de Helena Blavatsky)

O Evangelho de S. João diz-nos que no princípio era o Verbo, que o Verbo estava com Deus, e que o Verbo era Deus. Nesta única frase que, aparentemente se refere a três coisas distintas, mas que não o são – trata-se apenas de três formas diferentes do mesmo princípio – encontramos três conceitos acerca da mesma e única verdade. Por um lado, que no princípio nada mais existia senão o Verbo, pois se no princípio era o Verbo, quer dizer que nada mais havia para além dele; por outro lado, o Verbo estava com Deus, portanto, o Verbo era algo que pertencia a Deus ou que era parte de Deus; por fim, o Verbo é o próprio Deus, ou seja, Deus manifesta-se através do Verbo, que é uma emanação de Si e que é, ao mesmo tempo, Ele próprio.
Nós temos a tendência de associar o termo Verbo a uma emissão de som, à palavra proferida. Talvez não estejamos muito errados, embora uma emissão de som possa ter várias cambiantes, pode ser um som musical, uma palavra ou até um som inaudível aos nossos ouvidos humanos. Para a tradição oculta, cujo conhecimento nos chega através das estrofes do Livro de Dzyan, a emissão de um som ou de uma palavra é algo de muito responsável. A palavra não existe por si, não é independente, ela é formada primeiro no pensamento e só depois é que é proferida. Portanto, a palavra está intimamente associada ao pensamento que a criou.
Pronunciar uma palavra é dar forma sensorial a algo que já existe no plano do pensamento, é evocar esse pensamento e fazê-lo presente. Se a palavra que proferimos é um nome, neste caso estamos a definir um Ser (uma entidade), e o expomos e condenamos, por meio da emissão da palavra (ou Verbo) à influência de potências ocultas.
Nós somos criadores, no verdadeiro sentido do termo, quando pensamos, pois cada pensamento é uma criação não só da nossa mente, como também de tudo aquilo que sentimos e que leva à sua elaboração. Quando o transformamos em palavra passa a ser, para cada um de nós, aquilo que Ele, o Verbo, o converte quando a pronunciamos.
A palavra é a arma mais poderosa que o homem tem tido, desde sempre, à sua disposição, pois só através dela se conseguem mover multidões. Nenhuma guerra, nenhuma revolução é possível, se não houver a palavra a motivar as pessoas e a uni-las num objectivo comum. Nenhuma transformação da humanidade em termos políticos, económicos ou mesmo de educação, foi feita senão pelo uso apropriado da palavra. Por exemplo, há quem diga que o nazismo teve origem na profunda recessão económica que grassava na Alemanha na altura. Isto é em parte verdade, essa recessão económica não fez mais do que colocar o povo alemão em condições receptivas para a propaganda do regime que o levou a cometer as maiores atrocidades, ou seja, as condições económicas tiveram um efeito de amplificação sobre a força das palavras usadas na propaganda.
Assim, a palavra de cada homem é em si uma potência de energia e pode tornar-se, inconscientemente para ele, em bênção ou maldição, dependendo do uso que dela faça. A nossa ignorância acerca das propriedades da ideia e da matéria causa-nos frequentemente problemas sérios, e pode tornar-se fatal para nós. As agências de publicidade sabem isto, talvez de forma inconsciente ou empírica, mas sabem-no, e não há ninguém hoje em dia, nesta sociedade de mercados, que não seja, de alguma maneira, condicionado pelas ideias lançadas por elas. Veja-se o caso do azeite, produto apreciado desde a mais remota antiguidade, que nos anos recentes foi lançado ao ostracismo como prejudicial para a saúde porque era preciso lançar no grande consumo os produtos seus sucedâneos. Isto feito, toda a gente consumindo óleos e margarinas das mais variadas origens, ressuscitaram-se as qualidades do azeite, que afinal até é bom para o colesterol.
Através da palavra nós temos o poder de dispensar saúde ou malefícios de acordo com as influências ocultas, unidas pela Sabedoria Suprema aos seus elementos, isto é, as letras que os compõem e os números correspondentes a essas letras. Isto leva-nos à Cabala que, além da Árvore Sefirótica também possui um alfabeto constituído por 3 letras mães ou matrizes, 7 letras duplas e 12 letras simples. Cada uma das letras possui um significado oculto, é uma potência de energia e, conforme a sua associação, assim podemos retirar os efeitos que desejarmos – a sua combinação produz efeitos mágicos. Isto acontece da mesma forma com o sânscrito, que é também um alfabeto muito antigo, acontecia com o alfabeto egípcio e acontece com todos os alfabetos, mesmo com o que usamos hoje no mundo ocidental.
Nós habituámo-nos, nesta sociedade de hoje transformada no reino da quantidade, a não dar o devido valor às palavras que pronunciamos. Corrompemos o seu sentido, especulamos com elas, para atingirmos objectivos nem sempre os mais correctos. A palavra tornou-se uma mercadoria de uso corrente e a sua aplicação tem-se multiplicado até à infinidade. Os efeitos deste uso indiscriminado e irresponsável não podem deixar de se fazer sentir, e talvez muitos males que afligem a humanidade tenham origem, precisamente, no mau uso que fazemos do seu poder. Cabe aqui lembrar uma das profecias do Papa João XXIII:
“Babilónia tem demasiadas línguas. Quebraste a cadeia, tu o sabes. Sabê-lo-ás até à morte. Línguas diferentes para o sacramento, línguas diferentes para a palavra.
Hoje ela desapareceu.
Retiraste o exorcismo ao sacramento (pela palavra) e viste o rosto de Satanás.
Não basta falar.”
As vogais, por exemplo, são potências ocultas formidáveis. Todos conhecemos ou ouvimos falar que os “mantras” cantados pelos brâmanes e, no geral, pelas religiões orientais, são usados para produzirem determinados efeitos.
O Livro de Dzyan chama ao poder da palavra “a Legião da Voz”, uma referência às entidades ocultas por detrás desse poder. Diz que esta Legião é o protótipo da “Hoste do Logos” ou “Verbo”, o Princípio da Unidade Eterna. Isto é, por outras palavras, a mesma coisa que nos diz o Evangelho de S. João, pois o Verbo é o “UM” manifestado, não eterno na sua presença (porque é uma manifestação de Deus), mas eterno na sua essência (porque é Deus). Diz ainda o Livro de Dzyan que a “Legião da Voz” está relacionada com o som e a linguagem, como efeito e corolário da Causa – o Pensamento Divino. Quando a mente cria e evoca um pensamento, o signo representativo deste existe gravado por si mesmo no campo astral, que é o receptáculo de todas as manifestações da existência. O signo expressa a coisa, quer dizer, a coisa já existe gravada na tela astral e o pensamento apenas a coloca em actividade; a coisa é a virtude oculta do signo, ou seja, o efeito que o pensamento provoca ao despertar a força oculta.
Falando ainda do Evangelho de S. João que, por algum motivo é considerado o mais hermético, podemos afirmar que o Verbo é o Pensamento Divino, a Causa de todas as coisas criadas. Podemos imaginar esse Verbo, emanado do Pensamento Divino, como uma vibração primordial, uma vez que tudo quanto existe é vibração, tudo está em constante movimento, a própria matéria é vibração, pois os átomos que a constituem e lhe dão forma vibram permanentemente. Quando se diz que a matéria é vibração, evidentemente que não estamos a falar de como ela se apresenta aos nossos olhos físicos, porque aí não conseguimos observar nenhuma espécie de movimento, estamos a falar da sua constituição interna que é feita de átomos e outras partículas.
É notável que a ciência ainda não tenha chegado a nenhuma definição concreta sobre o comportamento dos átomos. A Física Quântica também não o conseguiu fazer, diz apenas que o comportamento é uma coisa como nunca se viu, querendo com isto dizer que transcende todas as leis da física conhecidas e testadas. Quanto ao sistema de um átomo, formado por um núcleo e rodeado de electrões, como se fosse um sistema planetário, os electrões não giram à volta do núcleo como os planetas à volta do Sol. Parecem antes movimentar-se em ondas e não é possível saber-se a posição de um electrão num determinado e exacto momento. Por outro lado, a matéria vista em termos atómicos é um imenso vazio, pois os componentes dos seus átomos encontram-se a enormes distâncias entre si. Se fosse possível aumentar o tamanho do núcleo de um átomo para 1 milímetro de diâmetro, os seus electrões estariam a 100 metros de distância. Por isso, o mundo atómico é um imenso e escuro vazio. Um átomo é tão pequeno que uma simples gota de água contém milhões de milhões de milhões de átomos.
Apesar deste imenso vazio, uma força extremamente poderosa os mantém unidos e permite formar todas as coisas a que chamamos matéria. Os electrões estão em permanente movimento, seja sob a forma de ondas ou de outra qualquer, originando o que chamamos de vibração, que abrange todo o Universo.
O Livro de Dzyan diz-nos, acerca do “Despertar do Cosmos”, que uma vibração freme através do infinito, tocando o Universo inteiro e o germe latente nas trevas. Estas, as trevas, ao serem tocadas por essa vibração primordial, irradiam luz, e esta luz vai originar o nascimento do Cosmos.
Dito de outra maneira, isto é o mesmo que encontramos no Evangelho de S. João, no Génesis, na tradição hindu e na tradição hebraica dos ensinamentos da Cabala, cuja Árvore Sefirótica nos mostra a Criação como o resultado das emanações divinas. Um raio (supomos de luz), vindo de cima, do En Sof (o mundo não manifestado), atravessa todas as Sefiras até se condensar na matéria (Malkhut), que é a Sefira mais inferior e corresponde ao mundo plenamente manifestado, ou seja, à existência da matéria. É interessante verificar que o outro nome de Malkhut é Reino, e isto pode muito bem querer dizer que, apesar de colocado no último grau da escala descendente, ele é o cume atingido por todo o processo da Criação – a obra final de Deus.

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