quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Conversas com Samuel Dalatando

I – A Fraternidade Rosa-Cruz – 6ª Parte

- O que é um homem religioso? – Perguntou Samuel, como se estivesse a pensar alto.
Voávamos já em território brasileiro, devíamos estar por alturas de Recife, mais ou menos a duas horas e meia da chegada ao Rio de Janeiro. A comissária acabara de nos servir o pequeno-almoço, uma notável refeição onde não faltavam as frutas, os ovos mexidos com bacon e, naturalmente, o café e o leite. Estremunhados depois de algumas horas de sono, espreitando pela janela o esplendoroso espectáculo do nascer do Sol, raiando o céu de azuis, lilases, vermelhos e amarelos, aquela refeição parecia o nosso pecado original, tal a gula com que nos dedicámos a ingerir aquelas iguarias.
- Um homem religioso? – Respondi. – É aquele que segue uma religião.
- Não. Esse é um crente. Um homem religioso é mais do que isso, é aquele que adopta a religiosidade como base da sua vida e procura transmitir aos outros a sua experiência espiritual.
- Porquê essa pergunta?
- Porque acho que Saint-Martin, acima de tudo, era um homem religioso.
- Finalmente estamos a falar de Saint-Martin. Porque é que acha que ele era um homem religioso? Não era ele que defendia a ideia do Homem-Deus?
- Sim. Mesmo por essa ideia se vê a sua religiosidade.
- Não entendo.
- Veja bem. Saint-Martin trilhou de início o mesmo caminho que Willermoz, ele foi também um dos “Elus-Cohen” de Pasqualy. Seguiu o caminho indicado por Pasqualy para atingir a iluminação através da magia cerimonial, na qual, para além dos ensinamentos da Cabala, se invocavam os poderes angélicos, presumivelmente superiores.
- Certo. E então?
- Foi nessa altura que ele escreveu a sua obra mais famosa, “Dos Erros e da Verdade”.
- Sim. Mas essa obra é ainda baseada na doutrina de Pasqualy, na magia dos números, uma noção que o acompanhou durante toda a vida. Trata-se ainda da magia cerimonial ou, como alguns afirmam, da mística dos números. Embora o livro seja algo confuso, ele achava que tudo na Natureza correspondia a um número, numa espécie de analogia com a Cabala, no que se refere às potências das letras hebraicas. Não vejo aqui nenhuma religiosidade, excepto no facto dele achar que a Matemática era uma cópia ilusória da verdadeira ciência, entendendo-se naturalmente que a verdadeira ciência estava acima da compreensão dos homens, e acima sobretudo do intelecto.
- Sim. Mas ele também achava que a iluminação não vinha dos sentidos nem dos processos cerebrais, que era uma dádiva sobrenatural, tal como a religião, que era um meio de transmitir sabedoria a quem pudesse percebê-la. Ele era um excelente matemático, mas tinha da Matemática a noção de que era incompleta, pois a verdadeira Causa de Tudo não podia ser explicada racionalmente. A verdadeira Causa de Tudo seria, no seu entender, um Ser inteligente e superior, incompreensível para a razão humana. Por isso disse que ele era um homem religioso.
- Compreendo onde quer chegar. Enquanto Willermoz se afastou da religião como meio de atingir a iluminação, levando para o “seu” Rito Escocês rectificado toda a magia de Pasqualy, Saint-Martin afastou-se desse caminho estabelecendo a sua própria doutrina que veio a resultar nas várias formas de martinismo.
- Não sei se Saint-Martin aprovaria muito do que se passa hoje nessas ordens martinistas. Tenho a impressão de que muitas são um pálido reflexo da sua doutrina.
- Tudo evolui, não é? Mas falando ainda dos “Erros e da Verdade”, tentei ler o livro mas acabei por não compreender grande coisa. Ao fim e ao cabo trata-se quase de um tratado matemático ou sobre questões matemáticas.
- Concordo em que não é fácil entender esse livro. Já o li há bastante tempo e não me lembro bem do seu conteúdo. Mas lembro-me de ter ficado com a impressão de que Saint-Martin procurou justificar a sua doutrina de regeneração ou de retorno à situação primordial do homem antes da “Queda”, através dos números e de fórmulas matemáticas, dizendo que estas eram incompletas pois não concebia a existência da Causa de Tudo.
Seria fácil neste momento em que escrevo estas linhas, pegar no livro e fazer algumas transcrições que elucidassem melhor sobre o diálogo que estávamos a ter, mas não o faço por fidelidade a essa conversa, mesmo que nela se vejam algumas incorrecções ditadas pela interpretação do livro, que continuo a considerar bem confuso.
- Penso o seguinte – continuou Samuel –, que Saint-Martin viveu num período muito conturbado politicamente com a revolução americana e a revolução francesa, e que na altura, se saía de um período grande da História em que as acções do homem se justificavam quando procurava executar as obras de Deus na Terra, mesmo através de processos científicos, e se entrava num período em que a ciência, nomeadamente a Matemática, pretendia afastar-se de Deus e explicar tudo de forma racional.
- Então Saint-Martin procurou lutar contra essa nova corrente…
- De certo modo. Ele preconizou a existência do Homem-Deus, algo rejeitado pela ortodoxia cristã mas que, para nossa surpresa, foi um tema introduzido no Concílio Vaticano II, embora esse tema, como outros, tenha sido ignorado ou repudiado pela hierarquia católica dos papas que se seguiram a João XXIII. Saint-Martin achava que esse estatuto de Homem-Deus era o estatuto primordial do ser humano, criado à imagem e semelhança do seu Criador. Que a “Queda” provocara o estilhaçar das faculdades concedidas ao ser humano, mas essas faculdades poderiam ser recuperadas através da regeneração. No entanto, o homem não tinha capacidade para se regenerar sozinho, precisava do “Reparador”, do acto de sacrifício do Cristo, para que o homem pudesse encetar o seu verdadeiro caminho de retorno. Neste aspecto, a doutrina de Saint-Martin é como que uma continuação das ideias expressas nos primeiros manifestos rosacruzes, o Fama e o Confessio.
- Mas essas ideias não estão patentes nos rituais martinistas actuais…
- Não. De facto não estão ou, como alguns dizem, estão implícitas nos rituais, o que não é a mesma coisa. O Cristo dos rituais martinistas é o Cristo gnóstico, o do coração, ou melhor dizendo, o Cristo interior de cada um.
- E onde é que aparece Jacob Boheme?
- Sei que a partir de determinada altura Saint-Martin começou a corresponder-se com Jacob Boheme e a adoptar muitas das suas ideias. Eu nunca li nada de Jacob Boheme, portanto, a impressão que tenho é a de muitos comentários que tenho ouvido. Parece que não era um homem culto como Saint-Martin, que era um simples sapateiro alemão e que terá escrito os seus livros através daquilo que hoje está muito em voga, a escrita automática, ou psicografada. Quero dizer que ele deveria ser um médium e escrevia os livros como hoje se escrevem muitos dos livros espíritas.
- Jacob Boheme seria então um espírita…
- Provavelmente. O espiritismo ainda não tinha sido sistematizado por Kardec, mas a prática era a mesma.
- Mas pelo que entendo, Saint-Martin renunciou às práticas teúrgicas dos rituais de Pasqualy e de Willermoz, afirmando não serem necessárias para que o homem se sintonizasse com a divindade.
- É verdade. Por isso não se compreende muito bem a sua associação com Boheme. Por outro lado, ele parece ter recuperado ideias do cristianismo primitivo, como a ideia preconizada por Joaquim de Fiore, o caminho da humanidade para uma era do Espírito Santo ou “Paracleto”. Ele via a Revolução Francesa como uma etapa importante desse caminho. Ele via a violência que se seguiu como uma punição pela indiferença à Causa Verdadeira, mas que ao mesmo tempo era o prenúncio de uma libertação maior da humanidade. Ao fim e ao cabo, a revolução e a violência era um acto doloroso de profundo sacrifício pela redenção da humanidade.
- Sei que estamos quase a chegar ao Rio de Janeiro, mas não queria deixar passar uma questão importante, o “Homem de Desejo”, uma ideia defendida por Saint-Martin.
- Sim. “Homem de Desejo…” O que é que ele entendia por isso? Para ele os homens de desejo eram aqueles que pretendiam arrancar de si a servidão à condição de pecador. Procuravam imitar Cristo encarnado, e desse modo, receberem a inspiração e sabedoria divinas, expiando os pecados através do sofrimento e sacrifício.
- Realmente, dessa forma ele era um homem religioso… – completei.
- Mas Saint-Martin é um assunto muito maior do que esta simples conversa. Talvez um dia venhamos a falar dele mais completamente. É importante notar que ele se intitulava “O Filósofo Desconhecido”, o que quer dizer muita coisa e que o coloca na linha directa dos primeiros manifestos rosacruzes, escritos anonimamente.
- E o que me diz da herança que ele deixou, quero dizer, do martinismo actual.
- Quando olho para alguém com um emblema martinista na lapela do casaco, naturalmente que essa pessoa não se identifica com o “Filósofo Desconhecido”.
- Entendo…
O avião já se aproximava da pista do aeroporto do Galeão, hoje aeroporto Tom Jobim, e já tinham pedido para apertar os cintos. Samuel iria tomar um voo de ligação para Brasília e eu ficaria no Rio durante essa semana. Combinámos encontrar-nos, se possível, no final dessa semana, quando ele voltasse de Brasília.
À saída do aeroporto, enquanto procurava um táxi que me levasse ao hotel, o tradicional cheiro de querosene encheu-me as narinas – estava no Rio de Janeiro.

terça-feira, 10 de agosto de 2010

Conversas com Samuel Dalatando

I – A Fraternidade Rosa-Cruz – 5ª Parte

Estava muito frio em Nova York naquele mês de Janeiro. Lembro-me de ter visto na torre de um edifico a leitura de 17 graus Fahrenheit, o que em centígrados dá menos de 5 graus negativos. Durante três dias em que estive naquela cidade tentei contactar o Samuel, mas não consegui encontrá-lo, nem em casa, nem no escritório. Uma das suas secretárias disse-me que ele estava fora, mas não disse onde. Naquela altura os telefones celulares ainda não existiam, ou estavam ainda no início do seu desenvolvimento.
No último dia da minha estadia fui convidado para tomar o pequeno-almoço no apartamento de uma querida amiga, a Lydia, que morava na rua 52, a mesma rua em que morava o Samuel. Lydia, que também era amiga de Samuel, disse-me que o tinha encontrado duas semanas antes na apresentação de uma colectânea de obras musicais das principais peças encenas nos últimos anos na “Broadway”. Ofereceu-me o “cd”, que ainda guardo, com músicas que ficaram na história dos musicais da “Broadway”, o local de encontro de N. York com o teatro.
Voltei para o hotel, o mesmo que sempre utilizei nas minhas estadias em Nova York, o hotel Roosevelt, localizado na rua 45 e próximo da Av. do Parque, e preparei-me para viajar nessa noite para o Rio de Janeiro, onde a temperatura devia, nessa altura, ser bastante mais acolhedora.
Na primeira classe daquele B-747 havia poucos passageiros, talvez uns três. Sentado na grande poltrona, que se podia transformar praticamente numa cama, bebericando um cálice de champanhe e observando o embarque dos passageiros retardatários, vi com surpresa o Samuel entrar na cabina, procurar o seu lugar, duas filas à frente da minha, e sentar-se. Há coincidências estranhas. Depois de o procurar durante três dias em Nova York, eis que ele aparece a viajar no mesmo voo que eu.
Levantei-me para o cumprimentar e ele levantou-se também, para guardar uma pequena mala na bagageira. Olhou para mim e o espanto e alegria estamparam-se no seu rosto. Depois do vigoroso abraço que sempre trocamos quando nos encontramos, pediu à comissária de bordo de podia mudar de lugar e sentar-se a meu lado.
Disse-lhe que estava em Nova York há três dias e que não tinha conseguido encontrá-lo. Respondeu-me que acabava de chegar de Washington, onde estivera durante uma semana e que agora ia para Brasília, onde o aguardavam encontros importantes. Faria a conexão no Rio de Janeiro.
Eu ficaria no Rio de Janeiro, onde tinha marcada uma reunião da empresa para que trabalhava e depois talvez fosse até Curitiba visitar alguns amigos na Grande Loja da Ordem Rosacruz. Uma viagem longa como esta seria o ideal para tentarmos colocar as nossas conversas em dia. Era uma excelente oportunidade para voltarmos a falar de duas figuras que considero muito importantes do percurso iniciático ocidental, Willermoz e Saint-Martin.
Depois de conversarmos sobre generalidades, foi durante o jantar que o assunto foi abordado e foi Samuel quem começou.
- Então, como é que vão os seus estudos sobre a fraternidade Rosa+Cruz?
- Acho que cheguei a uma espécie de impasse. Por um lado, é para mim evidente que essa fraternidade não existiu no plano concreto. Atribuiu-se a condição de Rosa+Cruz a algumas personalidades, pelas suas obras ou pensamento, mas que essa condição não corresponde a algum tipo de organização. Por outro lado tenho que reconhecer que os ensinamentos de algumas escolas filosóficas ou iniciáticas, como por exemplo alguns ritos da Maçonaria e algumas manifestações Rosacruzes, são demasiadamente valiosos e não foram criados agora, vêm de muito longe.
- Já vimos isso. Já chegámos à conclusão de que nada foi inventado agora ou pelos supostos promotores dessas organizações.
- Pois é. Mas como é que isso tudo chegou até nós? Que corrente de transmissão foi mantida ao longo dos séculos? O Cristianismo? Os alquimistas?
- Também já vimos que o movimento Rosacruz, ou melhor, as ideias rosacruzes, nasceram dentro do Cristianismo, aproveitando a liberdade provisória concedida pela Reforma iniciada por Martinho Lutero.
- De acordo. Mas nasceram dentro do Cristianismo ou foram divulgadas, beneficiando da liberdade provisória concedida?
- Sei o que quer dizer. – Concordou Samuel. – Para entender isso temos que pensar na mentalidade da época, séculos 16 e 17. Naquele tempo, a única missão concedida ao homem, mesmo através da ciência ainda despontando, era realizar as obras de Deus na Terra. Quero dizer, tudo estava criado, competia ao homem descobrir os mistérios dessa criação e manifestar sobre a Terra as obras divinas. Dentro deste princípio, nada podia ser feito fora de religião, mesmo os manifestos rosacruzes preconizavam uma sociedade nova, mas cristã.
- Quando é que as coisas começaram a divergir?
- Para mim, o grande promotor da nova era liberta das amarras religiosas, ainda que subordinando a sua filosofia a noções religiosas arcaicas, como o “Queda” do homem, foi Martines de Pasqually, que veio revolucionar todas as ideias com a sua doutrina da Reintegração. Ao contrário da religião, que não permitia nenhuma esperança além da vida eterna depois da morte, Pasqually preconizava a reintegração do homem na sua condição primordial de antes da “queda”, como ser divino criado à imagem e semelhança de Deus.
- Aqui vamos dar com Willermoz e Saint-Martin, seus “Elus Cohen” mais distintos, que desenvolveram as suas ideias, embora por caminhos diferentes.
- Sem dúvida. Mas nestas coisas não podemos ignorar também a condição humana, que apesar da busca espiritual encetada por vezes com vontade e perseverança, não se livra de alguns defeitos, como a vaidade e o orgulho.
- Sim, sei que Willermoz era bastante orgulhoso, gostava de ostentar títulos e honrarias.
- É verdade. Mas também teve a notável contribuição de Pasqually, que lhe conferiu os títulos mais elevados.
- Por mérito? Talvez. De professor primário na região de Lyon, em França, tornou-se provavelmente na figura mais marcante da Maçonaria. Mas para que pudesse realizar o trabalho que realizou, era absolutamente necessária uma boa condição económica, pois houve outros que entraram pelo mesmo caminho e acabaram na miséria, lutando pela sobrevivência. Willermoz era um rico e poderoso fazendeiro, portanto, a questão económica estava garantida, embora não saibamos em que condições explorava as suas terras.
- Na época, sem dúvida através dos “moços da gleba” .
- Provavelmente, mas temos que considerar a sociedade da época, não podemos ajuizar pelos padrões actuais.
- Mas depois de atingir os mais altos graus na Maçonaria e nos “Sacerdotes Eleitos” de Pasqually, – continuou Samuel – Willermoz não estava contente com o conteúdo das Ordens Maçónicas, principalmente com a “Estrita Observância” que, segundo ele, tinha perdido o seu legado original templário. Dizia ele que se tratava de um sistema infundado e não provado, faltava-lhe a qualidade eterna que encontrara na doutrina da reintegração de Pasqually.
- Foi nessa altura que ele resolveu fundar o seu próprio rito, o “Rito Escocês Rectificado”.
- Exacto. Por isso é também conhecido como o “Rito de Willermoz”. Ele achava que a Estrita Observância mostrava uma profunda ignorância das coisas essenciais, uma situação que não encontrara nos “Elus Cohen”, cuja doutrina mostrava tratar-se de uma Maçonaria para além da Maçonaria.
- Interessante. Sempre entendi que a doutrina da reintegração de Pasqually era a reintegração da semelhança do homem com Deus. Ou seja, para Pasqually o homem tinha sido criado à imagem e semelhança de Deus mas, depois da “Queda”, retera a imagem mas não a semelhança. Esta seria retomada através da iniciação e do conhecimento, que se acreditava ser um legado de uma doutrina muito antiga. Foi isto que Willermoz levou para o “Rito Escocês Rectificado”?
- Foi. Inclusive levou para lá muito dos rituais dos “Elus Cohen”, como a cabala, a teurgia e a alquimia.
- Isso foi uma revolução dentro da Maçonaria.
- Sem dúvida. Mas os tempos em que tudo isto se passou cheiravam mais a pólvora do que a incenso. Ele lançou o seu “Rito” em 1778, época em que a França apoiava a luta nos EUA pela independência. Repare que a declaração de independência americana é feita no dia 4 de Julho de 1776, mas a guerra continuará por mais uns 5 ou 6 anos. Em 1789 eclodiu a Revolução Francesa, com o seu lema “Liberdade, Igualdade e Fraternidade”, atribuído por alguns a Saint-Martin, mas que parece ter sido criado por Jean-Jacques Rousseau.
- Foi uma época de completa transformação da sociedade e das referências dessa sociedade. Mas com a sua Maçonaria Willermoz afastou-se das ideias rosacruzes e do seu objectivo essencial de criação de uma sociedade melhor dentro do Cristianismo.
- Sim. Seguiu um caminho diferente de Saint-Martin, mas o seu “Rito Escocês Rectificado” continuou bem vivo até aos dias de hoje. Sem ele não haveria a complicada história do Priorado do Sião.
- Espere aí. Priorado do Sião? Corresponde a alguma realidade ou foi uma mera invenção do Sr. Pantard?
- Foi invenção e não foi. Mas poderemos falar disto em outra altura, pois acho que você está mais interessado agora em falar de outra figura carismática chamada Louis-Claude de Saint-Martin.
- Sim. Mas essa referência ao Priorado abriu-me a curiosidade. Falaremos disso certamente. Falando em Saint-Martin, ao contrário de Willermoz, não se afastou das ideias rosacruzes, antes as desenvolveu, que o caminho para Cristo era o único caminho.
- Por algum motivo ele ficou conhecido como “O Filósofo Desconhecido”, que pode significar algumas coisas, mas a designação tem muito a ver com uma fraternidade invisível.
O excelente jantar, regado com um óptimo vinho da Borgonha, tinha chegado ao fim. O ronronar dos motores do avião ajudava a tornar as pestanas um pouco mais pesadas e as ideias pareciam não surgir com clareza. As comissárias tinham apagado as luzes, depois de servirem café, conhaque, fruta e uma tábua de queijos. Embrulhados em mantas de pura lã, combinámos continuar a conversa pela manhã, após passarmos por algumas horas de sono. Ou então, quando do regresso de Samuel da sua viagem a Brasília, em que ficaria no Rio durante uns dois ou três dias.