Quantidade não é qualidade. Quanto maior a multiplicação de uma determinada coisa, menor e mais fraca será a sua energia original. Da mesma forma, quando as manifestações exotéricas se sobrepõem às esotéricas, tende a perder-se a essência original, o verdadeiro sentido ou significado do simbolismo. Ou seja, quando a coisa se torna pública, perde a sua verdadeira natureza. E não adianta o argumento do “núcleo central”, o tal grupo de eleitos que se supõe preservar a pureza original, o verdadeiro segredo. Presumindo que existam esses “núcleos centrais”, não se percebe muito bem qual seria a sua missão. É óbvio que muitas coisas se passam no gabinete do Papa que não são do conhecimento de mais ninguém, a não ser dele e de alguns cardeais assistentes. Mas esta é uma situação normal em qualquer organização – há sempre decisões tomadas que não serão nunca do conhecimento da “arraia miúda”, como diria o Fernão Lopes .
Os antigos mistérios perderam a sua força original quando passaram a ser acessíveis a quem tinha dinheiro para comprar a sua iniciação, mesmo que não entendesse uma letra do seu significado. Passaram para os gnósticos que tentaram reproduzir, sob novas vestimentas, as antigas iniciações. Mas o significado das suas palavras perdeu-se, como aconteceu com Paulo, no mar exotérico do cristianismo literalista. Os antigos maçons, os que tentaram manter viva a chama legada pela velha Atlântida, viram-se forçados ao esquecimento, a ocultarem-se, a confundirem-se na multidão, tentando preservar a todo o custo os velhos ensinamentos.
Foi preciso chegarmos ao século XVIII para vermos despontar por todo o lado na Europa inúmeras Lojas maçónicas, inúmeros ritos, inúmeras Ordens iniciáticas, tudo numa enorme confusão. A maioria dos nomes famosos de ocultistas, alquimistas, mestres iniciados, viveram nesse século de luzes, em que as luzes se acenderam realmente, depois de uma muito escura travessia dos séculos em que a Igreja teve o domínio absoluto das mentes e da vida de cada um. Mas quando se passa do muito escuro para o muito iluminado, corremos o risco de nos ofuscarmos. Foi o que aconteceu com grande parte das organizações que surgiram, muitas delas não passaram do papel ou das ideias de alguns “iluminados”
Mas foi um século de luzes, sem dúvida. É nesse século que surgem e são contemporâneos nomes como Louis-Claude de Saint-Martin, Jean Baptiste Willermoz, Martinez de Pasqually, Conde de Saint Germain, Conde Cagliostro, só para citar os mais conhecidos. Muitos deles, como Martinez de Pasqually e o Conde de Saint Germain fizeram da sua vida um mistério, sobre o qual se estabeleceram lendas e especulações, como no que concerne à sua origem, quantos anos viveram, etc. Muitos deles, também, procuraram fazer ressurgir uma tradição antiga há muito esquecida. Não sabemos hoje até que ponto foram fiéis a essa tradição antiga, pois muito do que existe hoje em termos de rituais maçónicos foi criado justamente nessa altura.
Martinez de Pasqually tornou-se uma figura controversa. Apareceu aparentemente do nada e organizou a Ordem dos Elus Cohen (Sacerdotes Eleitos), da qual participaram e foram seus discípulos Louis-Claude de Saint-Martin e Jean Baptiste Willermoz. Escreveu um livro intitulado “Tratado da Reintegração dos Seres”, que mais não é do que um discurso sobre os primeiros Livros da Bíblia, o Pentateuco. Não se sabe ao certo a sua origem e nacionalidade, dizem uns que nasceu em Grenoble, na França, mas outros que era um judeu espanhol. Houve alguns que alvitraram a ideia de se tratar de um judeu de origem portuguesa, mas esta ideia não parece ter qualquer fundamento, ou tem o mesmo fundamento da origem do Conde de Saint Germain, acerca de quem um “iluminado” escreveu um livro dando-o como nascido na rua do Ouro em Lisboa, filho de um ourives judeu.
Não se sabe onde é que Martinez de Pasqually foi buscar os rituais que implementou na Ordem dos Elus Cohen, a qual deu origem depois a várias Ordens Martinistas e teve influência na maçonaria, através de Willermoz, que reformulou o ritual do Rito Escocês, criando assim o Rito Escocês Rectificado.
O mais estranho da figura de Martinez de Pasqually foi ele ter aparecido como encarregado de uma missão, que fez por cumprir, retomando a antiga tradição dos mistérios através dos Elus Cohen, e depois retirou-se para a ilha do Haiti, onde terá morrido longe da obra que implementou na Europa. Aparentemente encarregado por alguém de uma missão pois, em carta que dirigiu a Willermoz, refere-se ao “chefe” por duas vezes, explicitando que, acima dele havia mais alguém. Esse “chefe” permaneceu incógnito pois, até à data, não se faz a menor ideia de quem seria.
Os herdeiros de Martinez de Pasqually seguiram caminhos diferentes: Jean Baptiste Willermoz levou para a maçonaria do Rito Escocês a operatividade teúrgica dos Elus Cohen; Louis-Claude de Saint-Martin não estava de acordo com essa parte teúrgica, afastou-se e acabou por fundar a Sociedade dos Filósofos Desconhecidos, que mais tarde, pela mão de Papus, deu origem ao Martinismo. Papus achava que as antigas escolas iniciáticas egípcias e orientais tinham por base leis universais que usavam símbolos e glifos só decifráveis por iniciados e transmitidos, no decorrer dos séculos, em formas inalteradas e inalteráveis. A transmissão desses segredos esotéricos era, naturalmente, reservada para um número restrito de pessoas, pertencentes a Sociedades Secretas, cujo fim era a perpetuação desses ensinamentos. Quis estabelecer uma ponte ou ligação entre o Martinismo e o Rito Escocês da maçonaria, mas não conseguiu levar por diante esse intento, pois morreu em 1916, durante a 1ª Grande Guerra, de tuberculose.
Outra figura misteriosa foi o Conde de Saint Germain, sobre o qual se têm estabelecido inúmeras especulações e contado algumas lendas. É suposto ter sido visto em pontos diferentes simultaneamente, ora em Itália, ora em França, ora na Alemanha; é suposto ter vivido muito tempo, qualquer coisa como mais de trezentos anos; é suposto ter aparecido a Guy Ballard, no monte Shasta na Califórnia, e transmitido ensinamentos que depois esse senhor Ballard transformou num livro a que chamou “O Livro de Ouro de Saint Germain”. O que se sabe ao certo é que de facto existiu e foi contemporâneo de outros Mestres, como já vimos anteriormente.
Falta falar do outro Mestre do século XVIII, Alessandro Cagliostro, que previu a Revolução Francesa e o seu triunfo, e foi a última vítima da Inquisição, que o encarcerou no Castelo de Sant´Angelo, em Roma, devido aos seus dotes mediúnicos e de cura. Quando o povo o quis libertar do cativeiro, em 26 de Agosto de 1795, foi informado pelos seus carcereiros e inquisidores que José Bálsamo, um nome por que também era conhecido, acabara de morrer.
Como homenagem a esses Mestres do nosso passado próximo, termino com a transcrição da “Mesa dos Três Mestres”, tal como foi publicada no livro “As Profecias do Papa João XXIII” de Pier Carpi, editado em português pelas Edições António Ramos, em 1977.
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PARA AQUELE QUE NÃO SE DEVE NOMEAR
Paz. Paz no triângulo, na pirâmide, nos três pontos que conhecemos, reconhecemos, revelámos.
A Paz dos três mestres do passado, nas três cores sagradas.
Reconhecemo-nos no encarnado do sacrifício que cimenta o casamento do branco e do preto, que ninguém poderá jamais separar, até ao fim dos tempos escondidos nos tempos. As asas do pelicano estão abertas. O peito está rasgado pelos nossos mestres, para nós, os discípulos.
Para aqueles que chamaremos mestres.
Para os irmãos.
Hoje a rosa floresce sobre a cruz.
H. M. T.
Livres os irmãos, livres os mestres no plano que continua. Livres na espada, na máscara, na mão.
Quando pediram para destruir, foi conservado. Mas os descendentes da águia e da serpente, da flecha e da serpente, saberão reconhecer-se fora das prisões.
Hoje, eles saem e encontram-se na estrada com a carne viva dos mestres do passado. E juntos são a luz.
O Templo foi destruído porque é imortal. Não tinha tecto, hoje não tem paredes. É como a mesa do Sol.
O Templo está em toda a parte e os nossos passos serão sempre mais leves.
Escolhei a hora e o nome. Escolhei o homem. E imponde pela força que possuís.
Vós conheceis o gesto e a palavra. Sede livres, como foram os mestres.
Apenas com o silêncio construí a palavra.
Procurai-a dentro de vós. Seja ela sempre a mesma da operação do Sol. No grande Templo, ressuscitado nasce o Templo no momento em que vos encontrareis. E não quebreis nunca as cadeias. Nós testemunharemos isso.
H. M. T.
Trabalhai e enriquecereis.
Deixai profundas marcas no vosso caminho sempre do sul para o norte, como o vento quer. Não voltai atrás.
Estas são as quatro partes do mundo.
A primeira luz.
A cadeia de luz.
A luz na mão.
A primeira luz que dareis.
Sede livres ao fazê-lo. Escutai o apelo dos que querem. Sede livres de escolher.
E lançai fogo aos vossos juramentos, pela vossa liberdade de existir.
H. M. T.
Procurai os túmulos. Os nossos mestres não os tiveram, nós não os teremos, vós não os tereis. Eles vivem. Procurai-os.
Para aquele que não se deve nomear.
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(Assinaturas autografadas)
LOUIS-CLAUDE DE SAINT-MARTIN S. I. I. (……)
LE COMPTE DE SAINT-GERMAIN R+C
LE COMPTE DE CAGLIOSTRO G. C.”
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