ESPIRITUALIDADE
Esta é uma palavra que deixou as paredes dos templos, das igrejas, dos conventos, como tem vindo a ser usada há muitos e muitos séculos, e passou a fazer parte do dia-a-dia corrente, sendo aplicada a inúmeras situações e sendo utilizada arbitrariamente na execução de milhares de livros, na realização de convenções, palestras “workshops” (seja lá o que for que isto queira dizer), e cursos, supostamente dirigidos ao despertar da espiritualidade que, dizem, reside no interior de cada um.
Pode-se aprender espiritualidade em livros? Julgo que não, apesar de haver muita gente que tem ganho autênticas fortunas editando livros dedicados ao tema. Pode-se aprender espiritualidade em convenções, palestras e “workshops”? Penso também que não, que é um grande equívoco. Pode-se aprender espiritualidade em cursos de meditação ou algo semelhante? A minha resposta continua a ser negativa. Pode-se aprender espiritualidade nos templos, nas igrejas e nos conventos? Também não. Pode alguém ensinar espiritualidade a alguém? Não. Porque ninguém ensina nada a ninguém e a espiritualidade não se aprende.
O ser humano é um espírito experimentando a vida num corpo físico, logo, a espiritualidade é uma condição natural. Ele nasce espírito e morre espírito, embora esta designação de espírito tenha vários significados, alguns bem diferentes, consoante as escolas que a usam.
Não importa o nome por que é conhecido, espírito, alma, personalidade-alma ou outro qualquer. Trata-se de algo transcendente que engloba o nosso ser por inteiro e que nos faz saber que somos mais do que o corpo físico, que nos faz sonhar com lugares especiais, que nos faz desejar voltar para casa, ainda que não saibamos onde é que a casa é.
O ser humano nasceu espírito e em espírito cumpre o longo caminho das encarnações. Desde a mais remota antiguidade que ele sente que é um pouco mais do que o corpo. Começou por adorar as forças da Natureza, que o aterrorizavam. Estabeleceu vários cultos a vários deuses e assim foi subindo na escala evolutiva, até desembocar nas actuais religiões, supostamente detentoras de espiritualidade.
Mas pode haver espiritualidade numa igreja que criou a inquisição e se estabeleceu durante muitos séculos como um império governando o mundo? Poderá haver espiritualidade no mundo muçulmano, que propõe a “guerra santa” contra os infiéis, só que os infiéis são todos os que não são muçulmanos? Poderá haver espiritualidade entre o judaísmo, com toda a sabedoria dos seus livros sagrados e da Cabala, mas agarrado a formas de vingança corporizadas no “olho por olho, dente por dente”? Poderá haver espiritualidade no hinduísmo, no panteão dos 300 mil deuses, apesar da trindade original e superior, mas insistindo em costumes atávicos de verdadeira miséria? Poderá haver espiritualidade no budismo, cujos monges criadores das mandalas e cantores de inúmeros mantras, mas que prosseguem numa religião que alguém já chamou de “religião sem Deus”?
Evidentemente que sim, que pode haver espiritualidade dentro de todas essas religiões, pois a espiritualidade não reside na religião, mas em cada um dos seres que constituem os seus membros. Enquanto religiões e estabelecendo rituais e mediadores (sacerdotes, pastores, etc.) entre o membro e a divindade ou as divindades, perseguem interesses materiais pouco condizentes com a doutrina que apregoam.
Quem se debruça um pouco sobre a história das religiões verifica que se trata, na verdade, de uma história de sangue e de domínio e exploração por uma elite auto-constituída que se assume detentora da verdade e da salvação dos pobres súbditos. O próprio budismo, apesar das pretensões de alguns, não foge à regra. Nascido na Índia, onde é muito pouco apreciado, atingiu a sua mais forte expressão no Tibete, onde se estabeleceu um reino governado por monges, cujo principal responsável tomou o nome de Dalai lama, que não significa nenhuma atribuição espiritual, mas designa apenas o rei do Tibete. O que é que os monges fizeram pela população pagã durante séculos? Nada, absolutamente nada, mantiveram essa população nas condições da idade medieval europeia. Quando os chineses invadiram o Tibete em 1950, foram recebidos em festa pela maior parte da população.
Apesar de se considerar geralmente que a espiritualidade está ligada à religião, em muitos casos as coisas se confundem de tal modo que há quem ache que é a mesma coisa, de facto não está. A espiritualidade faz parte de todo o ser humano, só precisando de condições e oportunidade para se manifestar, o que pode levar várias vidas. As religiões e todas as formas de culto, as ordens iniciáticas e de cavalaria, os costumes tradicionais ritualizados nas sociedades mais antigas, são apenas caminhos ou meios através dos quais se pode evoluir e expressar a espiritualidade.
Aquele ou aquela que consegue expressar a espiritualidade de forma plena, está num grau de evolução superior e a espiritualidade passa a fazer parte de todo o seu ser, reflectindo-se nos seus actos, pensamentos e na vida do ser como um todo. Não há espiritualidade a meio tempo, tem que ser a tempo inteiro.
Ad rosen!
(A partir do 4º parágrafo, texto recebido por inspiração de Mestre K. no dia 6 de Março, cerca das 21h30 horas de Birigui.)
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