sexta-feira, 29 de agosto de 2008

Lamechices e Choraminguices

Ainda sobre as últimas Olimpíadas de Beijing tenho lido alguns artigos em jornais e algumas intervenções via Internet lamentando os “fracos” resultados conseguidos pelos atletas brasileiros, os quais chegaram mesmo a pedir desculpas públicas por esses resultados. Textos como “Sou tomado de melancolia ao contemplar o desempenho do Brasil nas Olimpíadas… e constatar nossa colocação no quadro de medalhas… comparar o nosso país com os países que estão à nossa frente”, ou “Fico depressivo ao contemplar na TV nossas minguadas medalhas de bronze” são sintomas de uma errada perspectiva do que representam os Jogos Olímpicos. Provavelmente muitos estariam à espera de que os atletas repetissem a proeza dos Jogos Panamericanos realizados no ano passado no Rio de Janeiro, em que realmente conquistaram um ror de medalhas e a assistência carioca se portou horrivelmente, com uma total falta de desportivismo, vaiando os atletas dos países adversários. Alguns amigos meus, empolgados com tal desempenho chegaram a prever um sucesso semelhante nas Olimpíadas. Disse-lhes na altura que não tivessem grandes esperanças, que nas Olimpíadas a competição seria de outro nível, que haveria muito mais países representados, além do facto de nos Jogos Panamericanos alguns países se terem feito representar por equipas de segunda linha.
Os atletas brasileiros sentiram essa pressão, canalizada pelo público, pelos meios de comunicação, pela família, pelos amigos. Eles teriam que ser os melhores, teriam que ser os primeiros, teriam que ganhar muito ouro, teriam que corresponder às expectativas de toda uma população que esperava resgatar todas as suas frustrações, angústias e anseios, endeusando os heróis olímpicos no pedestal do ouro. As medalhas de prata e bronze não interessavam, porque são medalhas secundárias, sem valor real.
Ora bem, conquistar uma medalha de bronze significa colocar-se em terceiro lugar entre os melhores atletas do planeta. Não significa nada uma medalha de bronze? E a de prata, que corresponde ao segundo lugar numa competição entre os melhores do mundo, também não presta?
Os atletas brasileiros pediram desculpa pelos fracos resultados conseguidos. Mas eles não tinham que se desculpar. Eles fizeram o melhor que puderam e, se não conseguiram melhores resultados foi porque houve outros melhores que eles. Não há nenhuma desonra numa medalha de bronze ou de prata, como não há nenhuma desonra em não conseguir nenhuma das medalhas. A desonra seria o desinteresse, a falta de aplicação, a falta de vontade em vencer. Não houve nada disto, todos se aplicaram o máximo que puderam. Portanto, estão de parabéns, como todos os outros que se aplicaram a fundo, independentemente dos resultados conseguidos.
Surpreendeu-me a reacção que vi em alguns atletas depois de não terem conseguido a almejada medalha de ouro. Choros, lágrimas nos olhos, amuos e atitudes pouco educadas em relação ao público e a jornalistas. Crises desnecessárias se não vivessem no equívoco de que apenas a medalha de ouro é que interessava, e outro equívoco maior de que eles eram realmente os melhores. Os resultados provaram que não eram os melhores, pelo menos naquele momento.
O desporto, como muitas outras coisas, é sempre o reflexo de uma sociedade, não adianta culpar este ou aquele, este governo ou outros governos, a sociedade é a responsável pelos padrões e valores que desenvolve no seu seio. Portanto, para que os resultados apareçam a nível desportivo é preciso que a sociedade mude e não se deixe ficar apenas na cerveja, no churrasco e no futebol dos fins-de-semana. Por outro lado, não existe uma relação directa entre a qualidade dos atletas e o tamanho do país. Países bem pequenos e com reduzida população produzem atletas de alta competição, como se viu mais uma vez nestas Olimpíadas.

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