segunda-feira, 17 de março de 2008

Os Segredos de Fátima IV

Onde está a verdade?
“No vazio está o gérmen de todas as coisas. E este gérmen é a Suprema Verdade”
Lao Tse – Século VII a. C.

Nas três crónicas anteriores abordei o assunto de Fátima pela perspectiva histórica dos acontecimentos que levaram à construção de um dos maiores santuários da cristandade. No aspecto histórico podemos dizer que há duas Fátimas: A Fátima 1, a oficial, aquela que se projectou no mundo católico como o local das aparições de Maria; a Fátima 2, aquela cujos fenómenos foram preanunciados e depois ocultados por interesses de poder temporal. Analisando os factos na sua origem e com base nos primeiros depoimentos dos videntes, podemos dizer que Fátima 1 não corresponde à verdade e Fátima 2 está impregnada de uma verdade histórica e misteriosa. Evidentemente que tudo foi feito para tornar verdadeira a Fátima 1: memórias de Lúcia, livros, filmes, etc. Isto com pleno sucesso, pois hoje quase ninguém quer saber da Fátima 2, daquilo que verdadeiramente aconteceu na Cova da Iria em 1917.
Ninguém parece ter reparado que os fenómenos ocorreram entre Maio e Outubro, envolvendo o solstício de Verão (no Hemisfério Norte) e o equinócio do Outono, tendo sido anunciados antes da Primavera. Ou seja, antes da Primavera é o anúncio de um renascimento, no Verão a maturidade, no Outono o anúncio da morte próxima, configurada no Inverno. Nos ritos pagãos da Antiguidade todas estas épocas tinham um significado muito especial e eram comemoradas com festas e rituais apropriados. Esta tradição sobreviveu dentro do cristianismo pois, não é por acaso que as festas e romarias se realizam dentro daquele período.
A mensagem não oficial de Fátima, aquela que consta dos primeiros inquéritos, não é uma mensagem de sacrifício, mas de esperança e anúncio dos tempos vindouros. Lúcia é convidada pela entidade a aprender a ler. Trata-se de um convite de libertação e um anúncio de novos tempos onde a mulher se tem vindo a libertar dos velhos grilhões e a humanidade a livrar-se gradualmente das velhas vestes dogmáticas e opressoras. Infelizmente o que ocorreu foi justamente o oposto, o aprofundamento das velhas dependências psicológicas e emocionais que são, em síntese, a mensagem oficial de Fátima.
Ensina-nos a Física Quântica que somos os construtores do mundo que nos rodeia. Que somos os nossos próprios criadores, ou seja, que criamos tudo quanto existe, desde ideias, pensamentos, até às coisas materiais, as quais influenciamos permanentemente pelos nossos pensamentos, sentimentos e emoções. Desta forma, se muita gente, milhões de pessoas acreditarem em algo que não tenha existido historicamente, esse algo ganha vida própria e passa a ser uma verdade inquestionável. O inconsciente colectivo é o repositório das ansiedades, dos desejos, do desespero, da esperança, dos sonhos, dos pensamentos, das emoções do ser humano. A verdade histórica deixa de ter importância, fica reduzida ao pó das gavetas e das prateleiras das bibliotecas, e passa a ser uma verdade que, nos tempos actuais, poderíamos chamar de verdade virtual. Mas não deixa de ser real pelo facto de lhe chamarmos virtual. E quando esta verdade virtual se cristaliza no inconsciente colectivo, torna-se indestrutível, porque se alimenta permanentemente da fé dos que nela acreditam. Sempre foi assim desde que há História, muitas coisas que hoje assumimos como verdades absolutas nunca aconteceram na realidade.
Se por um lado há efeitos positivos para a sociedade nesta cristalização de ideias no inconsciente colectivo, principalmente na uniformização de comportamentos que tornam viável a vida em sociedade, por outro lado tem também efeitos nocivos, pois é dessa cristalização que resultam os dogmas e o fanatismo religioso ou político.
No caso de Fátima a verdade histórica foi anulada por uma verdade construída, que vem sendo alimentada dia a dia, ano a ano, pela fé dos devotos e peregrinos que projectam nela a sua crença, as suas ansiedades, adversidades, desespero, esperando sempre um milagre de compaixão que alivie a carga e as dores da existência. A verdade de Fátima é a verdade dos peregrinos das longas jornadas a pé, dos penitentes ferindo os joelhos à volta da capela para pagamento de alguma promessa, dos milhões de devotos espalhados por todo o mundo, que levam até ela o penhor das suas orações.
A verdade de Fátima tornou-se indestrutível e inquestionável pela vontade dos peregrinos e devotos, não importa se corresponde ou não a uma verdade histórica.

Sem comentários: