quinta-feira, 28 de junho de 2012

Cartas do meu Sanctum - O Medo da Morte

O medo da morte parece ser exclusivo dos seres humanos, pois enquanto animal é o único que tem consciência dela. Os animais possuem apenas o instinto de sobrevivência comum a toda a Criação e portanto, também comum ao ser humano através daquela parte do cérebro que herdámos dos dinossauros e que fica localizada na ligação da coluna com o cérebro. Este medo da morte tem provocado ao longo dos milénios em que esta sociedade tem existido, as mais diversas teorias acerca da continuação da vida para além da existência física terrena. Essas teorias têm formado um corpo a que poderíamos chamar de espiritualidade, dentro do qual vicejam as religiões, uma infinidade de seitas e muitos grupos de natureza ocultista, iniciática e esotérica. Na verdade a espiritualidade resulta da imensa preocupação do ser humano em relação ao propósito da vida física terrena e do medo enorme de que a morte seja o fim de tudo e que nada mais haja para além dela. Os não crentes e os ateus tentam ludibriar um sentimento que é comum a todos, pois no fundo têm tanto medo como os outros. Assim surgiram as religiões que, ao contrário dos avatares sobre os quais elas foram criadas e que existiram para dar um sentido mais elevado à existência humana (Jesus, Buda, Khrisna, etc.), basearam os seus ensinamentos ou a sua doutrina na pretensão de responder à pergunta sempre presente – o que haverá depois que eu morrer – e construíram toda uma estrutura social e política sobre esse eterno questionamento. A resposta das religiões permanecerá sempre na crença, pois nada do que possam tentar ensinar a respeito pode ser demonstrado. As organizações iniciáticas, ocultistas e esotéricas procuram reservar os seus ensinamentos apenas para os seus membros os quais, após serem “preparados” durante algum tempo estarão em condições de os compreender. Embora nem todos os ensinamentos ministrados por essas organizações digam respeito a essa questão suprema, a questão da morte, ela também é parte importante da sua nomenclatura. Muitas dessas sociedades iniciáticas e esotéricas reportam a sua origem ao Antigo Egipto onde, aparentemente, tudo terá começado em termos de espiritualidade. No Antigo Egipto as pessoas mais esclarecidas e de maior cultura tinham um medo terrível de morrer antes de terem feito as pazes com os seus inimigos. O antigo egípcio acreditava que a morte era uma passagem para a “terra dos mil anos”, que seria atingida depois de uma viagem tormentosa na barca que os transportaria. Chegados a essa “terra” ali ficariam durante os mil anos para depois renascerem. Tinham um medo terrível de ficar esse tempo todo a olhar para a cara dos seus inimigos, e assim esforçavam-se por estabelecer a paz com todos antes de partirem para essa viagem. Esta ideia tinha implícita a noção de renascimento ou reencarnação, ainda que ao fim de um longo período de mil anos. O cristianismo primitivo herdou esta noção de renascimento, mas depois a Igreja transformou-a em ressurreição dos mortos o que, na opinião de muitos, passou a constituir uma autêntica aberração, pois a ideia de ressurreição trás consigo a ideia de que é realizada com o corpo físico que nos serviu em vida. O cristianismo tenta demonstrar que é assim mesmo, e dá o exemplo da ressurreição de Lázaro e do próprio Jesus, que mais tarde aparece aos apóstolos com o mesmo corpo que tinha em vida. Evidentemente que não pode tratar-se do mesmo corpo, apesar da tumba ter sido encontrada vazia. Esta ideia de ressurreição, assim como as ideias de renascimento e reencarnação, pretende que a morte não existe, que a vida continua para lá dessa passagem tão temida. Mas a morte existe, o corpo físico morre, desaparece com o tempo. Se a morte existe para o corpo físico, o que é que transita afinal para um plano a que, principalmente grupos espiritualistas chamam de continuação da vida? A consciência? Os vários corpos subtis de acordo com teorias orientais? A alma? Na verdade quando uma luz se apaga por a lâmpada se ter fundido, a energia eléctrica continua lá, na ponta dos fios. Se colocarmos uma lâmpada nova teremos luz novamente, não a mesma luz antiga, mas uma nova usando a mesma energia (alma, espírito). Esta forma de renascimento ou reencarnação é a que faz sentido para mim. Ad rosen! (Escrito em Birigui, São Paulo, às 22h00 de 26 de Junho de 2012)

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